César Morán: “Roger Waters”

Concerto de Roger Waters em Madrid. 23/03/2023

FORÇA POÉTICA, DISCURSO CRÍTICO E A MÚSICA ESPERADA

AVANTAR ACTIVIDADES

César Morán: Cantautor, compositor e escritor

Difícil escrever sobre o superconcerto de Roger Waters o 23 de março em Madrid, na gira que chamou “This is Not a Drill”, e é-o pola sua magnitude poliédrica. Os seguidores vivenciais de Pink Floyd na década de 70 sabíamos da força emocional do grupo de rock progressivo que Waters fundara com Syd Barrett, depois de cuja desaparição Roger seria líder conceptual indiscutível. Na viagem de ida dizia meu irmão que se lhe poderia chamar “cantautor”, e a minha inicial reticência viria a ser algo menor trás o monumental espectáculo que se iniciou às 21h20 para findar justo à meianoite, quando se cumpriam os 50 anos do lançamento no Reino Unido do mítico The Dark Side of the Moon. E é que a grandeza se apoia em três eixos: a música e o som, o discurso social, claramente político, e o luxo de imagens e de luz.

Todo se inicia com a nova versão de “Comfortably Numb” no seu vídeo distópico projetado na enorme pantalha em cruz com quatro planos a fim de ser vista por todo o público que rodea o palco en trezentos e sessenta graus. Antes a voz de Waters em off falara irónica de telemóveis, convidando com humor os discordantes políticos para irem à barra do bar. Ao remate do tema eleva-se a pantalha e é quando vemos os músicos e um Roger Waters de 79 anos em forma física e mental que emite frases, percorre o palco e interpreta a parte segunda de “Another Brick in the Wall”, para colher o baixo e enfrontar o poder em “The Powers That Be”: “Eles são os poderosos. Se os ves chegar, é melhor correr, correr, melhor correr para a casa”. E Ronald Reagan aparece a falar na pantalha, porque ele, como os outros presidentes, é um criminal de guerra responsável do genocídio do povo maia na Guatemala, assim como George Bush pai masacrou as tropas iraquianas desarmadas que se retiravam de Kuwait caminho de Basora. Impressionante “The Bravery of Being Out of Range”, essa bravura de estar fóra de alcance. Sentado ao piano, um pouco Dylan, Roger saúda e fala longo, bebe e toca “The Bar”, voz grave em Si bemol com imagens de Lakota Sioux na pantalha.

Canta “Wish You Were Here” em íntima oitava baixa, coreado polo público. A saudade de Syd Barrett também está na esplêndida “Shine On You Crazy Diamond”, solo de saxo magnífico, e o espectáculo alcança a apoteose com o drone da ovelha em “Sheep” que nos leva ao descanso e enlaça com o drone do porco a iniciar a segunda: “Steel from the poor, Give to the Rich”. É o capital que rouba os pobres, entanto Waters chega vestido de ditador e ametralha com estrondo em “In the Flesh” e Run Like Hell”. Legendas críticas: FREE JULIAN ASSANGE, FUCK THE PATRIARCHY, FUCK THE WAR ON TERROR, FUCK THE OCCUPATION, HUMAN RIGHTS.

E não temos espaço para “Money”, “Us and Them (cadencioso)”, “Any Colour You Like”, “Brain Damage” e “Eclipse”, de The Dark Side of the Moon. Memorável o final, com Waters no piano e os excelentes músicos e as coristas arredor, indo-se com “Outside the Wall”.

(Publicado no número 549 de Sermos Galiza, suplemento semanalde Nós Diario, sábado 15-04-2023)



Outros artigos de César Morán :

César Morán: “Canet Rock 75”

César Morán: “Os esquecidos setenta”

Falar de Música

César Morán: “Pablo e Silvio, os dous “

César Morán: “O Bombardino de Charles Anne. O músico de Cunqueiro “

César Morán: “Compopstela, de Alfonso Espiño Louro “

César Morán: “Cantar nun concerto”

César Morán: “Parroquias tour” e saúde emocional

A opinión de César Morán: “A espera de Serrat”

A opinión de César Morán: “O mais parecido ao karaoke”

A opinión de César Morán: “Anacleto músico”

A Música da Fala

Tanxugueiras

Música ” Comercial “

Memória do Zeca

A Beleza

O clarinete de Aquilino

A Música desde o Público

Passar, verbo (in)transitivo. De Mirasol a Vinicius

FRANCO BATTIATO: popular e experimental, na busca do transcendente

Xela Arias. História de uma foto.

Cunqueiro e os Pentagramas

A presença da música ao vivo

Na taberna cultural da Arca da Noe

A Música em estado crítico

O Idioma da Música: A Língua do canto

A minha viagem com Dámaso Alonso